Gostaires Gonzalez o 'escrevinhador’. Natural de Santa Vitória do Palmar, reside em Rio Grande desde 1980. Autor de dois livros realçando as memórias dos GONZALEZ. Próprio de quem não quer deixar no esquecimento uma série de relatos que esclarecem uma nesga do tempo num lugar incomum.
Hoje, determinada hora fui tocado de saudade e de lembranças como um raio, algo grande; quando as coisas pequenas são notadas e da minha falta de conforto, me manti em desconforto onde estava, antes de mudar de pensamentos.
Tudo em torno do meu pai (João Eli Acosta falecido em setembro de 2007). Da falta que me faz nestes dias, em muitos momentos: falta quando acontece algo de novo na minha vida, acontecimentos grandes e pequenos, quando vejo um filme estupendo que sei que ele iria gostar, quando leio um livro, quando ouço alguma coisa que gosto ou musicas do “Nelson Gonçalves” o que ele mais amava. Eu queria partilhar esses momentos com ele.
Quando me sinto criança, precisava que ele segurasse pela mão! Bem que as atitudes mudaram com o tempo: quando crescido era eu quem o acalmava e mostrava-lhe o caminho.
Desde o jeito que tenho no caminhar, até dos ombros caídos
Do espelho, vejo o rosto dele diante de mim: o mesmo olhar que tenho. Quando o vejo refletidos de corpo e alma nos momentos de riso do meu filho, no olhar de um irmão, sem falar nos de meus sobrinhos.
Quem vai ouvir histórias do meu pai se não as conto!
Meu pai, (João Eli Acosta), trabalhava para adquirir algum dinheiro extra nas estâncias, notas de cruzeiros de dez mil, de “Santo Dumont” e de cinco mil, estampadas com a figura de “Tiradentes”. Ele aramava, cortava santa-fé, tosquiava e abria marachas à pá nas granjas para o plantio de arroz; em suma, fazia todos os serviços pesados deste mundo.
Nunca fez fortuna suficiente para contentar minha mãe. Quem fazia contas e, na sua matemática, sempre faltava algum dígito: a conta que alguém fizesse, para ela, estava invariavelmente errada.
Eli era prático e manso, não sabia cobrar suas “camperiadas” e, na boa fé, acabava carregando migalhas que, na ausência de maleta, amarrava as pernas da ceroula onde colocava o mantimento. Assim, em seu pangaré, baixava para o rancho.
A esposa (minha Mãe) não dava folga e preenchia o tempo todo, seja com as tarefas ou falando, mandando, exigindo. À beira dos “cascos”, acordava de madrugada, chamava todos nós e, apresentava um monólogo doentio incessante, por um motivo que ninguém entendia: na sequência apresentava um quadro convulsivo, com tendência suicida, atitude que até então desconhecia. Eli se aborrecia e, também a cavalo, se ia de casa logo de manhãzinha, chateado com a situação sempre irremediável.
De uma feita, lembro-me ainda, chovia muito; ela se molhou toda e convenceu-nos que morreria. Da mesma forma sem entender, passamos pelo maior estresse (palavra que não existia). No meu pensamento, se tirasse toda água da rua, ela não morreria. Aos prantos, peguei uma enxada e fui para a rua; abri diversas valetas para drenar o pátio molhado e, com o frio, era mais fácil aparar a “coriza” com a língua (hábito comum nas crianças, que deixava o lábio superior assado).
Luiza fazia pura pantomima teatral e convencia qualquer pessoa: até Deus ficara espantado e acabava com a chuva!
Alberto Amaral Alfaro
natural de Rio Grande – RS, advogado, empresário, corretor de imóveis, radialista e blogueiro.