Segundo historiadores, até a chegada dos navegadores europeus à América havia aproximadamente 100 milhões de nativos, sendo que neste território hoje denominado Brasil somavam cinco milhões. Na carta de Pero Vaz de Caminha a Dom Manuel são descritos como gente boa e de boa simplicidade, passíveis de imprimir-se ligeiramente neles qualquer cunho que lhes quiserem dar. Aí começa a saga dos nossos índios, jamais respeitados, sempre explorados, maltratados e até escravizados.
Nos bancos escolares tomamos conhecimento de uma figura já quase em extinção, resgatada em 1943 quando Getúlio Vargas criou, através de Decreto-Lei, o “Dia do Índio”, 19 de abril. Até hoje comemorado fantasiando as crianças de índios, sem qualquer preocupação com o resgate da história ou discussão sobre a vida dos remanescentes. No Carnaval de 1960, Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, eternizaram a marchinha “Índio quer apito”, até hoje presente nos festejos momescos. Pessoalmente, além dessas recordações escolares e de carnavais, vêm-me à lembrança os “Bugres”, maltrapilhos e cambaleando pelas ruas, mendigando algo e assustando as crianças pela aparência e dificuldade de comunicação.
Até o advento da Constituição Cidadã de 1988, os índios vinham exercendo papéis de coadjuvantes na história do País, recebendo de todos os governos o tratamento como tutelados, disciplinado pelo Estatuto do Índio. A Carta Magna descortina uma série de inovações que precisam ser assimiladas e trabalhadas por todos. A principal delas foi o reconhecimento do povo indígena como fundamental ao estado brasileiro, o respeito à sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. Até aqui tudo ia bem, pois não contrariava interesses.
Ocorre que a partir do dia 5 de outubro de 1988, quando da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, no seu artigo 231, são assegurados aos indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, sendo estas inalienáveis e indisponíveis e os direitos sobre elas, imprescritíveis. Por mais paradoxal que possa parecer, a aplicabilidade desse direito tornou-se, como tantos outros temas ideologizados, num conflito que se anuncia como prolongado e sem perspectiva de equacionamento, já que não envolve disputa por floresta virgem, todos recaem sobre terras produtivas, sob a alegação de que seriam, no passado, indígenas. Dentro dessa conclusão simplista tudo pertenceria aos índios, afinal estão por aqui desde sempre, antes da chegada dos descobridores.
Sem autonomia, os índios são manipulados pela FUNAI, pelo CIMI – Conselho Indigenista Missionário e por mais de seiscentas ONGs, nacionais e estrangeiras, que priorizam questões ideológicas e interesses econômicos não muito transparentes e confessáveis em detrimento da verdadeira causa indígena. A questão fundamental é a definição das tais áreas e a sua demarcação, até então sob a égide da FUNAI. Em boa hora, a Presidente Dilma determinou que outros órgãos, como a Embrapa e o INCRA, também opinassem sobre a tal “ocupação tradicional”, demonstrando a desconfiança do governo sobre a lisura e veracidade das decisões até então tomadas.
Isso é apenas a ponta do iceberg, vislumbro conflitos cada vez mais explosivos, pois implicam em interesses antagônicos e de difícil arbitragem, já que os proprietários rurais, na sua maioria, possuem títulos de propriedade, e essas invasões chanceladas por órgãos do governo caracterizam-se em verdadeiras expropriações. A respeito das tais “invasões pacíficas” - neologismo criado pelo petismo para justificar os esbulhos possessórios praticados diariamente no País, o Professor Denis Rosenfield, da UFRGS, asseverou: “Já passou da hora de deixar de falar em invasão pacífica. A invasão, por si só é um ato violento”. É efetivamente do passado a ambição do índio por apito, agora o pau vai comer por questões muito mais sérias.
Neste nosso compromisso de escrever um artigo ou crônica por semana para a nossa Folha Gaúcha e também para o www.blogdoalfaro.com.br, tenho tido a oportunidade de vivenciar experiências gratificantes e maravilhosas e conhecer pessoas que dignificam a essência do “ser humano” pelo exemplo e prática do bem.
Conheci dias atrás uma dessas pessoas, o Padre da Congregação Scalabriniana, Giovanni Corso, de origem italiana e há 51 anos em missão no Brasil. Atualmente é responsável pela “Stella Maris”, organização de apoio aos migrantes, com foco nos marítimos, instalada em Rio Grande desde 2010.
Ressalto que esta experiência local reveste-se de condição especialíssima, já que congrega o Padre católico Giovanni e o Pastor Luterano Ruben Adelar Bonato, que atuam de forma ecumênica, integrados no propósito único de servir ao próximo. Para melhor exemplificar esta obra, sabe-se que já realizaram a bordo de um navio, missa rezada pelo católico e com o sermão sob responsabilidade do luterano. Num mundo marcado pela intolerância generalizada, inclusive religiosa, estes apóstolos dão um testemunho impagável, digno das maiores referências.
Esse trabalho anônimo e de tanta relevância passa quase que despercebido pela comunidade rio-grandina, tanto que este colunista só tomou conhecimento do mesmo ao ser apresentado ao Padre Giovanni. Mas é da personalidade dos protagonistas e das instituições que representam, essa discrição, mas quando somos informados dos números e serviços prestados por esses “operadores da caridade”, vale a pena dividir essas informações, é o que me proponho neste pequeno espaço.
Além do apoio religioso diário, esses milhares de trabalhadores do mar que aportam por aqui recebem, extensivos às suas famílias: orientação jurídica, de prevenção à segurança física e da saúde, estrutura de comunicação, DVDs informativos traduzidos, entre outros. Só no mês de janeiro de 2013, segundo o registro do Apostolado, foram atendidas pessoas de trinta e três nacionalidades diferentes.
Nós, com essa relação atávica com o mar, com os viajantes, com os marinheiros, militares e mercantes, devemos nos aproximar desse trabalho, disponibilizando a estes “anjos dos migrantes”, recursos materiais e apoio pessoal, para que melhor cumpram com suas nobres missões. Lembremos que hospitalidade, cordialidade e disposição em informar são o mínimo que podemos fazer aos que nos visitam. Use a empatia, ofereça o que gostaria de receber.
Alberto Amaral Alfaro
natural de Rio Grande – RS, advogado, empresário, corretor de imóveis, radialista e blogueiro.