Ricardo Farias Carvalho, é Psicólogo formado em teoria psicinalítica e suas aplicações psicoterapeuticas e com especialização em Psicologia Clínica e Psicoterapia cognitivo e comportamental. Atende na Rua Dezenove de Fevereiro, 593/301 – Fones: (53) 3232-4677 e 8437-1066/8166-6324 – E.mail: ricardof.carvalho@uol.com.br.
Cada vez que vejo alguma notícia relacionada à morte no trânsito, em especial de algum jovem, não adianta, sofro. Vários questionamentos passam rapidamente pelo cérebro, tentando encontrar uma razão para constantes e absurdas perdas. Difícil, extremamente difícil. Sem sombra de dúvida, é uma das principais causas de vidas ceifadas prematuramente.
Uma das conquistas “básicas”, quando possível financeiramente, durante a adolescência, é a aquisição de um carro ou moto. Portanto, os 18 anos, com aval legal, são esperados ansiosamente. Na nossa cultura, e, pelas facilidades comerciais encontradas hoje em dia, os veículos citados são obtidos de maneira relativamente fácil. Pressões daqui e dali e os pais têm uma delicada decisão a ser tomada entre o permitir e proibir. Embora ocorra a proibição e, se houver uma obstinação, o trabalho é um passaporte que viabiliza o acesso. No meio de tantas tristezas compartilhadas, lembro de um adolescente que pediu uma moto para os pais e, diante da negativa, trabalhou arduamente até conseguir o objetivo. Teve “sorte”. Num acidente, não perdeu a v ida, porém, sequelas físicas, graves e irreversíveis, eram um atestado de que, no fundo, não estava “totalmente apto” aos seus 18 anos para dirigir. Os pais, mesmo conhecendo o filho, foram incapazes do impedimento maior. Culpas e sofrimentos mútuos assegurados.
Não precisaria nem citar a relação direta entre acidentes e álcool. É algo que “estamos acostumados”. Até demais. Casos e casos e o velho problema persiste. Tornou-se um aliado implacável a serviço da morte. A fantasia de que somos poderosos, que nada de ruim pode nos acontecer, somente com os demais, no mínimo, é uma negação “burra”. Um copo extra é um limite muito tênue entre um plano e outro. Será que todos que partem de modo inconsequente, sabem de forma precisa a dimensão da dor eterna daqueles que ficam?
Estabelecer a idade adequada para uma permissão é utópico. Talvez o termo consciência seja importantíssimo ou decisivo. Sem ela, independentemente da faixa etária, nada feito. O óbvio é que a sua falta faz falta. Antes dos condicionamentos sociais, do status que representa a aquisição de um veículo numa “tenra idade”, da relativa sensação de liberdade, temos que pensar, constantemente, na palavra educação. Estão sendo os nossos jovens preparados adequadamente para a responsabilidade de dirigir? O controle acerca dos impulsos que é imperativo no trânsito caótico das cidades é valorizado adequadamente? O que é uma “verdadeira” moral?
Certamente falta espaço para citarmos e elaborarmos os diversos e importantíssimos pontos determinantes deste caos mórbido de sonhos ceifados precocemente. Pais, escola e comunidade precisam se unir mais ainda, no sentido de tomarem medidas preventivas para minimizarem ao máximo possível dores que as palavras não definem. A única certeza, por enquanto, é de que inconsciência extrapola a questão mínima da idade acarretando lutos bárbaros e frequentes.
Durante a longa caminhada que intitulamos de vida, transcorrem inúmeros momentos que colocam o pensamento em cheque. Quem de nós que, num determinado ponto ou situação de crise, não questionou a própria sanidade? Como esta indagação, surgem várias outras. Em busca de respostas, enquadramentos, rótulos ou diagnósticos foram criados e fornecidos acerca da saúde mental das pessoas. Por si só, ao mesmo tempo em que auxiliam rumos a serem tomados, dependendo, provocam marcas altamente significativas. Muitos indivíduos simplesmente desenvolvem uma crença neste sentido e permanecem submetidos de maneira eterna. Destarte, o que foi colocado durante um “recorte” da existência, passa a ter peso. Muito peso.
Palavras como fóbico, depressivo, bipolar, etc., não deixam, de certa forma, de criar amarras internas. Com a facilidade da Internet que há hoje em dia e a decorrente listagem de possíveis causas e sintomas listados, desencadeia uma tendência, digamos “natural”, de carimbarmos o passaporte do eu para o sofrimento intenso, constante, e, ocasionalmente, permanente. Se “diagnosticados”, portanto, “devemos corresponder de modo devido”. Lembro de um médico que ao receber uma paciente ouviu a descrição extremamente detalhada da sua doença. Confrontando e sendo confrontado contínua e intensamente, teve suas colocações rechaçadas por esta. Apesar de todas as abordagens pertinentes, no final da “consulta”, sem saída, disse para a padecedora q ue permanecesse consultando o “Dr. Google”. No fundo, a queixosa desejava algo ou alguém que confirmasse o que pensava. Não possuía padecimentos e sim “imposições do que achava ter”. O rótulo, previamente formatado, desencadeou a certeza de que “era assim”. Portanto, a conclusão impossibilitava quaisquer colocações racionais ou coerentes. Identidade formatada. Inferno psíquico criado.
Existe uma enorme diferença entre ser e estar doente psiquicamente. Não é, absolutamente, igual. Um recorte ou parte, não pode e não deve justificar o todo. Caso isto ocorra, perdemos a capacidade de avaliarmos cuidadosamente as diversas teias estabelecidas. Esquecemos ou rejeitamos intrinsecamente a crença, sob outro ângulo, acerca da capacidade que possuímos de alterarmos as nossas mazelas emocionais. É imprescindível observar se, em linhas gerais criamos, podemos desfazer, recriar, redirecionar... Sem dúvida, a força para isso está em algum lugar do cérebro escondida ou acobertada. Ademais, até vários casos que implicam perda da realidade e que são considerados complicadíssimos, atestam a referida capacidade. Não obstante, se porventura ocor rer uma impossibilidade de mudanças nestes moldes é o princípio básico que auxilia qualquer ajuda psicoterápica. Termos a certeza de que “estamos e não somos” é importantíssimo. O referencial “tempo”, o grande senhor, somado a retomada da autoconfiança, precisam ser reconsiderados e valorizados.
Alberto Amaral Alfaro
natural de Rio Grande – RS, advogado, empresário, corretor de imóveis, radialista e blogueiro.