Ricardo Farias Carvalho, é Psicólogo formado em teoria psicinalítica e suas aplicações psicoterapeuticas e com especialização em Psicologia Clínica e Psicoterapia cognitivo e comportamental. Atende na Rua Dezenove de Fevereiro, 593/301 – Fones: (53) 3232-4677 e 8437-1066/8166-6324 – E.mail: ricardof.carvalho@uol.com.br.
Vivemos num mundo de pessoas conectadas, porém, distantes. É um pouco complicado entendermos diálogos dentro do mesmo lar através de teclas, assim como festas com celulares sob a mesa funcionando sem parar. Fazer ou manter amigos vai mais além. Muito mais. É um processo altamente complexo que requer empatia, cuidados e proximidade. Proximidade que, diga-se de passagem, não é necessariamente física. Sem sombra de dúvida, em condições ditas normais, não conseguimos ser uma ilha isolada. Precisamos uns dos outros para compartilharmos alegrias e tristezas, conquistas ou derrotas.
Existem amizades que são construídas precocemente na nossa existência. Outras, ao contrário, embora não sejam tão antigas, são perfeitamente viáveis. A relatividade que encontramos no fator temporal é significativa. Nesse processo ou construção, como nos demais vínculos que estabelecemos, num determinado momento, observamos ou sentimos algo que não esperávamos da pessoa considerada “especial”. Destarte, nossos aspectos bons são projetados e alguns deles são minados por facetas imperfeitas que nos surpreendem. A variedade dessas “imperfeições” nos seres humano s é impressionante. Não obstante, numa ocasião qualquer, nos deparamos com algo exacerbado ou, até mesmo, totalmente desconhecido. A sensação é de que esquecemos o quanto os indivíduos são dinâmicos e estão submetidos às leis do inconsciente. Ou seja, nem sempre possuem o total controle sobre os seus pensamentos e comportamentos. Essa imprevisibilidade absolutamente natural e as suas consequências, passam por um crivo rígido no sentido da continuidade ou não do elo. Em certos arranjos, como num quebra-cabeça, em decorrência do amor que sentimos, demoramos muito a ter uma visão do todo. Um pequeno detalhe, encaixado no lugar correspondente, fornece uma panorâmica real do funcionamento de quem elegemos como amigo. O que não víamos ou queríamos negar, diante de alguma atitude ou fato isolado, escancara, confronta tudo aq uilo que não desejaríamos conhecer. Dependendo da nossa personalidade, existem coisas que suportamos tranquilamente. Em nada ou quase nos afetam. Outras, ao mínimo sinal, fazem com que atinjam anos de convivência por pertencerem ao “departamento dos pontos inaceitáveis”. O que levou um curto ou longo período para ser alicerçado, não raro, em segundos, acaba definitivamente. Lapidação que, embora o trabalho despendido, não deu certo ou agradou. Infelizmente.
Diante dos aspectos supracitados, é extremamente delicada a forma para comunicarmos a ruptura. Num bom número de vezes, sem nem uma palavra sequer, há a referida comunicação. A distância e o silêncio, incontestavelmente, falam muito para as partes envolvidas. Nessa análise tendenciosa em relação aos que nos rodeiam é imperativo uma tomada de consciência de que também somos falhos ou deixamos a desejar. Amizades implicam aceitações mútuas e neuróticas. Dentro do possível.
Quando misturamos branco e vermelho, dificilmente, sabemos o ponto exato do surgimento da cor rosa. O avanço da medicina está tornando o limite da terceira idade um pouco difícil de definirmos com precisão. Muito mais do que números, sob o ponto de vista psicológico, envolve um estado de espírito. Nessa fase, diante de tantas surpresas negativas e positivas, uma, em especial, é complicadíssima.
Quando nos relacionamos com alguém durante anos, sem dúvida, são partes nossas que se fundem em todos os aspectos. O resultado, em condições normais, são casais encantadores que observamos nas ruas. Cabelos brancos, passos lentos e mãos dadas são um atestado incontestável de vidas compartilhadas em detalhes. União perfeita? Não existe. Simplesmente, neuroses mútuas que foram suportadas e que venceram os reveses de grande parte da existência. Tolerâncias, aceitações e carinhos. Por outro lado, embora a razão saiba que tudo é efêmero, mesmo assim, não queremos aceitar a fi nitude de quem amamos. Não raro, perdas oriundas de doenças que se prolongam durante anos ou súbitas, desmancham as almas dos nossos castelos. Tudo aquilo que vivenciamos, de um segundo para outro, é confrontado com um enorme vazio. O paradoxal é que, apesar de envolvimentos desgastantes física e emocionalmente, quando não os temos mais, ocorre uma sensação de luto agregada à falta de um “norte que propiciava um sentido”. Gradativamente, o cérebro precisa se encarregar de uma elaboração. Dependendo da personalidade, esse processo pode demorar mais ou menos tempo. Entra em cena a angustiante solidão. As lembranças, fora de controle, batem na porta e não perdem permissão para entrar. Qualquer brecha e lá estão elas atormentando de modo constante e intenso. Frequentemente, nem mesmo as pessoas que estão próximas são capazes de preencher as lacunas ocasionadas. Os filhos, geralmente com os seus arranjos feitos, nem sempre podem ajudar o quanto gostariam ou poderiam. Outras facetas, nesse momento, entram em jogo e atestam a complexidade de uma mudança na dinâmica familiar. Não obstante, o óbvio é que, “conversar com as paredes”, não é nem um pouco indicado. E, além disso, ter “cuidadores estranhos” à volta, não significa, necessariamente, estar acompanhado. Depende e muito.
A tendência humana, vejam bem que eu disse “tendência”, é de suprirmos no nosso ritmo, o “coração desabitado”. Aceitações e rejeições dos membros familiares. Dificilmente há um consenso ou unanimidade. Dessa maneira, opiniões, fantasias, dúvidas, incertezas, pessimismos, influências, entre outros, podem minar o desejo despertado de quem sofre. Porém, independentemente dos sinais físicos dos implacáveis anos, o amor é atemporal, não envelhece. Ademais, os tais “outros” só sabem, num plano teórico, o que é lidar dia após di a com diálogos solitários ou silenciosos. A química desencadeada por novos elos é indescritível. Diante dos pontos supracitados, arrisco dizer, prolonga significativamente o nosso recorte existencial e gera qualidade emocional.
Alberto Amaral Alfaro
natural de Rio Grande – RS, advogado, empresário, corretor de imóveis, radialista e blogueiro.