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Delamar Corrêa Mirapalheta
Advogado, Radialista e Vereador. Natural de Rio Grande, nascido no Taim, foi vice-prefeito e prefeito do Município.


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CORREDOR DA MORTE

quarta-feira, 10 de Agosto de 2011 | 19:04

O título sugere que escreverei sobre a morte. Ledo engano. Vou escrever sobre a vida. Então o porquê do título? Para criar uma introdução que desperte o interesse. As pessoas de um modo geral cultivam dentro de si uma indisfarçável morbidez. As histórias que envolvem sofrimento, desgraça e morte são as preferidas e tem o condão de se propagarem com a velocidade e devastidão de um vírus. Nem eu próprio sou diferente.  Certa vez, há uns vinte anos, eu ouvi um relato do então Secretário Estadual da Agricultura do Rio Grande do Sul, deputado federal Aldo Pinto, um homem simpático e bem falante, sobre um livro que acabara de ler. Contou ele, antes da audiência com um grupo de vereadores riograndinos, que um jornalista americano desejava escrever um artigo sobre a pena de morte. Ele queria captar com absoluto realismo os sentimentos, emoções e reações dos condenados à morte nos dias e se possível nos instantes finais que precediam a eletrocução.

Com esse objetivo, combinou com o diretor geral de uma penitenciária e foi levado para o corredor da morte. A estrutura era relativamente simples. Dez celas distribuíam-se ao longo do macabro corredor, no final do qual se situava a sala de execuções.  A mecânica consistia em executar um condenado por dia, o da cela número um a do final do corredor.

Pois bem, os dias foram passando e o jornalista entre uma e outra anotação foi sendo transferido de cela até chegar a número um. Nesse dia, como era do ritual cristão, o sacerdote veio ao encontro do condenado para reconciliá-lo com Deus. - Meu filho! Arrependei-te dos teus pecados e o Senhor na sua infinita bondade te acolherá no Reino do Céu. Padre, disse o prisioneiro, eu não sou um criminoso, não cometi qualquer delito. Na verdade sou um jornalista e estou aqui para registrar as últimas sensações de um condenado à morte. - Meu filho, eu compreendo o teu desespero. Contudo, deves te resignar com a pena e aceitar a tua culpa, só assim receberás os benefícios da misericórdia divina. Deu a benção e foi embora.  

A essa altura, entorpecido pelo medo, chamou os carcereiros e revelou a mesma versão.  Todos riram-se copiosamente da imaginativa história. Afinal, para eles era banal ver os mais impiedosos assassinos capitularem diante da morte. Numa última e derradeira tentativa solicitou a presença do diretor geral do presídio, no que foi atendido. Para a sua surpresa não era o mesmo com o qual havia feito a combinação. Foi informado de que o diretor anterior fora transferido havia três dias e de que nada sabia sobre essa inusitada combinação. Para ele o inocente jornalista, como constava do prontuário, era um     criminoso hediondo condenado a morte por eletrocução. Nada podia ser feito que não executar a sentença.

No dia seguinte, às 10h da manhã, o jornalista foi conduzido à sala de execução e conectado a cadeira elétrica. Indagado sobre se tinha algo a declarar bradou sua inocência e reiterou o equívoco. Dos gritos nem os ecos retornaram. Assistência silenciosa, olhos vendados, executor aposto e contagem regressiva em andamento. Contudo, no último instante, antes que o zero fosse cantado, a execução foi suspensa e a venda removida dos olhos do jornalista. Tarde demais, teve um infarto agudo do miocárdio e morreu.

Eu vivi uma experiência que embora não planejada e com final feliz guarda alguma relação com a que acabo de lhes contar.

É fato incontroverso, não só para nós riograndinos, leigos ou não, como para toda a região sul do Estado que o Hospital do Coração da Santa Casa do Rio Grande é um centro de excelência de alta complexidade no tratamento de doenças do coração. Todos sabem disso. Porém, daí a testarem na prática há uma considerável diferença. Eu me qualifico como testemunha ocular dessa decantada excelência, representada por um conjunto harmonioso de instalações modernas e equipamentos de última geração, tudo concatenado segundo uma logística muito bem pensada. Contudo, o verdadeiro segredo desse sucesso reside no sopro de gente que inunda os corredores, salas de pronto atendimento, UTIs, quartos, enfermarias, enfim, não há espaço que não esteja impregnado de energia de vida.

Todos, sem exceção, higienizadores, administrativos, técnicos de enfermagem e radiologia, enfermeiros (as) e médicos, por conta de incomparáveis conhecimentos nas suas áreas de atuação, somados formam uma legião multidisciplinar de anjos a serviço da vida. São sacerdotes na verdadeira acepção da palavra.

Não são elogios emocionais como seria razoável supor de alguém que acaba de ser literalmente ressuscitado de uma parada cardíaca. Sabemos que é um quadro gravíssimo, um retorno da morte. A propósito, nessa pequena viagem nada senti ou vi. Continuo acreditando que a existência do homem está restrita a sua dimensão corpórea. Para ser justo, quando o meu coração retomou o seu ritmo normal, eu vi uma dezena de Deuses vestidos de branco e uns poucos de azul. As suas faces rubras estavam iluminadas pela incontida satisfação de terem vencido a morte, mesmo que tenha sido uma vitória fugaz.

 

*Advogado


Escrito por *Delamar Corrêa Mirapalheta

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DIA DA RECONQUISTA

quarta-feira, 06 de Abril de 2011 | 14:21

*Delamar Corrêa Mirapalheta

 

A história do Rio Grande, do Rio Grande do Sul e do Brasil, em vários momentos foi definida por acontecimentos que ocorriam no velho continente. É esse o caso das invasões castelhanas, que foram motivadas por relacionamentos entre as cortes européias.

Em 1761 os governos da Espanha, Nápoles - na época um reino independente, e França, fizeram um pacto para combater o poder crescente da Inglaterra, que dominava progressivamente os mares e se consolidava cada vez mais como um império colonial. Esses países eram todos governados por reis da família Bourbon, descendentes de Luis XIV. Por essa razão, o pacto ficou conhecido como “Pacto de Família”.

Portugal não aderiu ao pacto, pois já era aliada dos Ingleses. A aliança vinha do tempo de D. João I, que era casado com a princesa inglesa Felipa de Lancaster. Contudo, esse não era o único e principal motivo, havia também um motivo econômico: Portugal dependia dos navios ingleses para o comércio em suas colônias. Os três poderosos reinos não aceitaram a atitude portuguesa. Espanha e França se consorciaram na formação de um grande exército e invadiram Portugal.

As hostilidades não se limitaram ao solo europeu, e se estenderam às colônias. Prevendo isso, o comandante da região do Rio da Prata, Gomes Freire de Andrade, ordenou que o governador do Rio Grande, Elói Madureira, tomasse medidas para impedir a invasão do território brasileiro pelas forças castelhanas. As medidas adotadas não foram capazes de evitar a invasão.

O governador de Buenos Aires, D. Pedro Ceballos, cercou a Colônia de Sacramento, então sob domínio português. No dia 29 de outubro de 1762 as tropas portuguesas que guarneciam a Colônia, composta por 900 homens renderam-se ante ao poderio espanhol alicerçado em uma legião de 4 mil soldados.

O passo seguinte da marcha espanhola sobre o Brasil foi a tomada do Forte Santa Tereza, atualmente em território uruguaio, ocorrida em abril de 1763, quatro dias após as forças espanholas terem tomado o Forte de São Miguel, próximo ao Chuí. Finalmente, em 24 de abril de 1763, a Vila de Rio Grande foi ocupada pelos espanhóis, fato esse que determinou o recuo do então governador Elói Madureira para Viamão, onde instalou a sede do governo.

A dominação espanhola, ao longo dos treze anos de sua duração, não foi benfazeja. Nada acresceu, cultural e materialmente, à noviça Vila do Rio Grande. Ao contrário, dilapidou o seu patrimônio e promoveu uma verdadeira diáspora dos seus habitantes. Muitos deles atravessaram o Canal do Norte, indo refugiar-se no lugar denominado ainda hoje de Estreito, onde o exército português entrincheirou-se na defesa do território brasileiro. Outros se deslocaram com suas famílias para os arredores da Vila, particularmente Ilha dos Marinheiros e Povo Novo. Outros tantos ficaram e foram vítimas de muitas atrocidades.

Mais de sessenta famílias portuguesas, por ordem de D. Pedro de Ceballos, foram transferidas para o Departamento de Maldonado, onde fundaram a Cidade de São Carlos, no Uruguai, hoje cidade irmã do Rio Grande, condição alçada pelo processo de geminação que tive a honra de celebrar em novembro de 2000, quando no exercício do cargo de Prefeito da Cidade do Rio Grande.

Durante os trezes anos de dominação espanhola, muitas foram as tentativas de recuperar a Vila. Contudo, só em 1º de abril de 1776 é que os portugueses, sob o comando do General alemão Johann Heinrich Bohm, contratado especialmente pela corte portuguesa para esse fim, lograram o intento de retomar o domínio dessa terra que nos serve de morada.

Há um fato hilariante que precedeu a ação militar que merece ser contado. No dia 31 de março, portanto na véspera da retomada, os soldados portugueses acantonados no lado norte do canal, onde se ergueu a mui heróica Vila de São José do Norte, festejaram o aniversário da rainha de Portugal Mariana Vitória. Vestidos a caráter, dançaram, cantaram e fizeram disparos de fogos e artifícios. Os espanhóis, imaginando que a exaustão dos soldados afastava qualquer possibilidade de tentativa na retomada, afrouxaram a vigilância, do que se aproveitou o General Bohm para na madrugada do dia 1º de abril de 1776, no silêncio da noite, transpor as águas do canal e de surpresa reconquistar a Vila do Rio Grande.

Em que pese a relevância histórica dessa epopéia, de importância comparável com a própria fundação da cidade pelo Brigadeiro José da Silva Paes, em 19 de fevereiro de 1737, não cultivamos entre nós o salutar hábito de rememorar esse feito.

Em 28 de abril de 2004 foi sancionada a Lei nº 5.924, de autoria do ex-vereador Renato Tubino Lempek, instituindo o “Dia da Reconquista”. Esse é o marco contemporâneo do reconhecimento desse extraordinário feito militar. No dia 1º de abril de 2008 foi sancionada a Lei nº 6.521, de nossa iniciativa, que inclui no calendário oficial do Município o Dia da Reconquista do Rio Grande. Com essas providências legislativas, esperamos nós, fique consolidada em definitivo as comemorações cívico-militares alusivas a essa efeméride.

Na manhã do dia 1º de abril de 2008, na Praça da Bandeira, à sombra do busto do Imperial Marinheiro Marcílio Dias, ilustre filho dessa terra, realizamos uma cerimônia singela mas significativa. Ao som do Hino Nacional hasteamos as bandeiras do Brasil, do Rio Grande do Sul e do Município do Rio Grande. Proferimos discursos onde consignamos a nossa gratidão pelo memorável feito dos nossos antepassados. Ao fim, coroamos a cerimônia com uma salva de 17 tiros de canhão, disparados do pátio do 5º Distrito Naval. O primeiro passo foi dado, cabe aos que nos precederem perpetuar a celebração.

Salve o dia 1º de abril, que doravante será conhecido entre nós como o “Dia da Reconquista”.

 

*Vereador e advogado.


Escrito por Delamar Corrêa Mirapalheta

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Alberto Amaral Alfaro

natural de Rio Grande – RS, advogado, empresário, corretor de imóveis, radialista e blogueiro.

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