Na minha infância, vivida na Vila Santa Tereza, Cidade do Rio Grande, na década de sessenta, os brinquedos que preenchiam o tempo eram o rolimã, o jogo de bolinhas, o jogo de tacos, o esconde-esconde, o pega-ladrão e a diária prática do futebol. Todos praticados nas ruas e campos disponíveis na região. Num turno a ida ao colégio, no outro a realização dos temas e trabalhos escolares, depois rua, atividades lúdicas simples e baratas.
Praticamente inexistiam nas crianças distúrbios tão comuns nos dias atuais, como a ansiedade, a obesidade, problemas de postura e visão, entre outros. Os pais tinham as preocupações de sempre com relação à saúde, estudos e companhias. Das drogas, tragédia contemporânea, nem se tinha notícias, eram outros tempos, muito mais saudáveis e proveitosos.
Nesta vida dita moderna, muitos limites foram impostos à infância. Nos centros urbanos, os espaçosos quintais deram lugar a apertados condomínios ou exíguos pátios, onde a criança ainda precisa, muitas vezes, disputar o gramado, onde todos sabem, é proibido pisar. O aumento da violência e o crescimento da perversidade na mente das próprias crianças combinados com a terrível corrida pela sobrevivência que assombra os genitores, faz surgir um problema de complexa resolução: como ocupar o tempo das crianças? Como proporcionar-lhes um entretenimento seguro e saudável?
Após longo predomínio da televisão com seus desenhos e filmes os dias inteiros, surgem os jogos eletrônicos, primeiro com videogames e depois, de maneira crescente e descontrolada, através dos computadores e todas as novas ferramentas de comunicação, que vêm proporcionando a proliferação de todas essas mídias, incontroláveis e acessíveis a todos. Infelizmente, frente a todas essas nuances, combinadas com a falta de tempo e alternativas, os pais levantam as mãos para os céus ao constatarem que seus filhos preferem utilizar todo o período disponível à frente de uma televisão, de um celular ou de um notebook. Pelo menos não estão expostos aos perigos das ruas, dos descaminhos. Muitas das vezes desconhecem o que estão fazendo, aí está o grande perigo desse comportamento. Desconhecem que esses jogos eletrônicos estão cada vez mais violentos, mais gráficos e mais predominantes. Creio que a razão é que, à medida que os jovens vão se acostumando com o grau de violência dos jogos atuais, precisam de outros mais violentos ainda para realmente serem excitados. Vejo aí o terrível dos jogos eletrônicos: eles não só condicionam ações como faz a TV, mas treinam o jogador a executá-las sem refletir nas consequências de seus atos, tornando-os autômatos, animalizados.
Esta crônica está sendo escrita 24 horas após a descoberta de uma chacina na Vila Brasilândia, zona norte de São Paulo, onde resultaram mortos um casal de policiais militares, o filho de 13 anos, Eduardo Bovo Posseghini, mais a avó e a tia-avó do jovem. Cinco vidas ceifadas com tiros certeiros na cabeça de cada uma das vitimas, vindos de uma pistola, calibre 40, encontrada debaixo do corpo de Eduardo. As investigações iniciaram hoje pela manhã e apontavam que as hipóteses iniciais de vingança pelo fato dos pais serem policiais ou de latrocínio estavam afastadas. A primeira surpresa na busca da elucidação da tragédia foi a descoberta de que o menino Eduardo usava foto de assassino de game no facebook havia trinta dias. O referido jogo de ação, na terceira pessoa, onde o jogador está na pele do personagem Altair, chama-se “Assassin’s Creed” ou Credo Assassino, o título é autoexplicável. No game o jogador vive durante o período das Cruzadas, e controla o tal personagem Altair, jovem, que tem como missão assassinar templários para evitar mais conflitos e terminar a Terceira Cruzada. Altair faz parte da Ordem Secreta dos Assassinos, denominada Hashshashin. Tudo ficção, tudo interesse comercial desenfreado. As vítimas reais foram o solitário Eduardo, seus pais, sua avó e tia avó. Que ensinamentos ou lições poderemos tirar desta tragédia? As conclusões estão com cada um dos nossos leitores.
O Brasil vive uma convulsão social e política que, tal quais as placas tectônicas - blocos gigantescos que sustentam continentes e oceanos - movimenta-se naturalmente, sem previsão ou controle. Arrefeceu na última semana, em virtude da visita do Papa Francisco, que participou da Jornada Mundial da Juventude, evento que concentrou 3,5 milhões de jovens no Rio de Janeiro.
Não sei se algum fenômeno pode ser utilizado para justificar o efeito desta visita papal, nem o propalado alinhamento dos astros, menos ainda alguma previsão do já desacreditado Nostradamus, o certo é que o Brasil passa a ser outro após estes seis dias: melhor, mais justo, mais politizado e consciente.
Dentro desse contexto de mudança que sacudiu o gigante adormecido, que começou lá por junho com as manifestações inicialmente defendendo a proposta do “Passe Livre”, dias depois, com o crescimento do movimento, diversas outras pautas foram acrescentadas de maneira voluntária, sem influência político-partidária. Os temas da corrupção e da má gestão pública acabaram se transformando nos mais relevantes, óbvio que coadjuvados pelas demandas na área da saúde, educação, segurança, mobilidade urbana, entre outras.
Linco os movimentos populares com a visita do Papa Francisco, por entender que o Sumo Pontífice, latino como nós, vizinho aqui da Argentina, tem o entendimento perfeito da situação política, econômica e social aqui do Cone Sul. Ao recomendar aos religiosos não se envolverem com ideologias políticas, ao refutar toda e qualquer possibilidade da utilização da sua visita como palanque político pelo Governo e exortar todos os jovens a serem protagonistas das mudanças que se impõem, frisando a esses jovens que não permitam que outros exerçam esse papel, já que o futuro chegará através deles, descortinou, sem politizar, que esse confronto é inexorável, já que os governos, invariavelmente, sempre priorizam as fortunas e agem como príncipes, sobrando à grande maioria da população os planos A, B, C...
Resumindo, o nosso Grande Pastor apontou caminhos, devolveu a confiança e a esperança ao povo, e deu testemunhos que mexeram com toda a gente brasileira. Causou tanto impacto essa visita, as entrevistas, os discursos e preces, que este cronista constatou por onde andou, escutou e leu, céticos, agnósticos e até alguns ateus balançarem em suas convicções. Não tenham dúvidas de que essa passagem será o marco de mudanças profundas, que o Brasil será outro, bem como a Igreja se aproximará mais deste povo, especialmente dos mais pobres - assim falou Francisco.
Com relação às movimentações sociais e protestos, recomeçarão imediatamente, acredito que com menos violência, outra recomendação do Papa, mas de maneira mais efetiva, renitente, até emergir uma percepção, um sentimento efetivo de que as coisas realmente começam a mudar. Quem viver, verá.
Entre junho e julho deste ano de 2013, ocupei por quinze dias o mandato de Vereador da nossa Cidade. Apesar de já ter exercido essa atividade por longos seis anos, entre 1982/1988, deparei-me neste retorno com mesmas demandas e necessidades de décadas atrás, que parece que se renovam ao longo do tempo. Com os gabinetes sempre atulhados de pedidos de emprego, de marcação de consultas e exames médicos, além de remédios, aterros e limpezas de ruas e valetas, os representantes do povo tornam-se meros despachantes, com exíguo tempo para novos projetos, novas propostas.
Óbvio que não me furtei dessa agenda quando procurado, afinal sempre tive essa preocupação de verear, de andar pela Cidade com olhos de observador, detectando e denunciando as más práticas cidadãs, especialmente em ataque a posturas e bons costumes. Esses e outros temas têm merecido sempre a minha palavra e a minha ação enquanto colunista de mídias impressas e radialista, com programa diário há doze anos, o Cultura Debate, na Rádio Cultura Riograndina.
Tema recorrente para este cronista, a situação da formação profissional no País continua a mercê de vigaristas e oportunistas, que oferecem, sem qualquer disciplinação ou fiscalização, cursos de formação, treinamento, qualificação e até reinserção, para os casos de reabilitação de trabalhadores acidentados. Sem qualquer compromisso com pré-requisitos, programas, conteúdos e carga horária, com desobediência ao que preconiza a CBO – Classificação Brasileira de Ocupações, essa vergonhosa situação cresce e se espalha pelo Brasil afora, impunemente.
Propus, nessa breve passagem pelo Legislativo, como indicação ao Prefeito do Rio Grande, Alexandre Lindenmeyer, a criação, através de Projeto de Lei de um “Selo de qualidade de educação, formação, qualificação e treinamento profissional”, que seria disciplinado e chancelado pela Secretaria Municipal de Educação, com a interface do MTB, Universidade Federal do Rio Grande e técnicos do Sistema “S”, entre outros.
Com isso, estaremos startando um movimento de garantia da qualidade para um serviço de fundamental importância para o nosso País, tão carente de profissionais preparados, além de banirmos do mercado esses verdadeiros “Mercadores de Ilusões”, que praticam um estelionato com requintes de crime hediondo, tamanha a perversidade dessas propostas. Os exemplos podem vir de qualquer lugar, inclusive, daqui. É a intenção do que proponho.
Por mais paradoxal que possa ser, a realidade é que temos uma constante e latente insatisfação com o período em que estamos vivendo. Na infância, queremos ficar moços para desfrutar da liberdade, que as crianças acreditam existir. Adultos, contamos os dias para a recompensada aposentadoria, onde acreditamos poder desfrutar da tal melhor idade, cada vez mais contestada, particularmente por quem chega nela.
Dentre esta série de crônicas que escrevo sobre a velhice, como em todas as ocasiões em que formalizo opinião, exponho vivências em que sou protagonista, por enquanto, na condição de parente, amigo ou observador. Breve, respeitando as classificações de longevidade, estarei entrando na terceira idade, com a esperança que os gerontologistas e geriatras me auxiliem nessa nova empreitada. A respeito, considerando a longevidade que a raça humana vem conquistando, muitos estudiosos já falam na quarta idade, que seria considerada após os 75 anos.
Minha mãe Alfa está com 85 anos de idade, lúcida e com a estrutura mínima necessária para uma velhice honrada. Cercada por familiares e amigos, tinha até poucos meses atrás atividades plenas, como gestão da sua vida, participação em movimentos sociais e de benemerência. De inopino, como quase tudo na vida, foi acometida de depressão, seguida de mudança radical de rotinas e desinteresse por tudo, inclusive de alimentar-se, como querendo dar um recado aos que lhe cercam. Óbvio que corremos na busca de auxílio profissional, além da conhecida psicologia caseira, onde com muita sinceridade e emoção lhe manifestamos a importância da sua presença entre nós por tudo que significa, pelo amor que lhe dedicamos e por suas mensagens e ensinamentos. Toda essa mobilização apresentou resultados, mas não conseguimos a retomada total da sua vontade de viver.
O Salmo 90 diz o seguinte: “Só vivemos uns setenta anos, e os mais fortes chegam aos oitenta, mas esses anos todos só trazem canseira e aflições. A vida passa logo e desaparecemos”. Considerando que essas orações e ensinamentos antecedem a era cristã, registra-se o documento como uma manifestação contemporânea, não definitiva, é lógico. Em ensaio anterior, reproduzi a frase de uma querida vizinha, com mais de noventa anos: “Viver muito é bom, mas dá trabalho...”. Como essa senhora também vive cercada de carinho e atenções, deduzi que esse tal “trabalho” fazia referência a ela própria, e que lhe tem custado a longevidade.
Muitos não estão preparados para a morte dos velhos. Por vezes, sequer querem tratar do assunto. Com certeza, alguns que estão lendo esta crônica o fazem com a testa franzida ou com o coração apertado, muito natural, pois na realidade não estamos preparados para o enfrentamento da questão. O novo não esta preparado para ficar velho, e este não está preparado para a morte.
Não é o caso da minha querida mãe, mas registro com a finalidade de reflexão, que a prática da chamada “Distanásia”, que é a prática pela qual se prolongam através de meios artificiais e desproporcionais, a vida de um enfermo incurável, também chamada de “obstinação terapêutica”, tem resultado em morte prolongada, comprovadamente acompanhada de sofrimento, o que é profundamente lamentável.
Encaro a velhice como um prêmio, uma dádiva, e como tal deve ser administrada. Encontrar razões para viver e dar significado à vida é o nosso grande desafio. Buscar substituir atividades e práticas que sempre nos deram prazer e manter aquelas compatíveis com o nosso estado mental e físico é o único caminho. Devem ter claro os nossos velhinhos que também vivemos pelos outros, desde que isso não represente um sacrifício intolerável. Portanto, enquanto for possível, viva por nós, mamãe.
O povo brasileiro é historicamente um sonhador, sempre alimenta a esperança de que algo de extraordinário vai lhe acontecer e que terá uma boa vida, que poderá alcançar aos seus dependentes o conforto mínimo necessário. Sem ambição e alienado aos problemas que ultrapassam os umbrais das suas humildes habitações, e presa fácil para mercadores de ilusões, salvadores demagógicos vindos através da fé e da política de resultados, aquela do “é dando que se recebe”, onde as bondades oficiais são oferecidas em troca de votos.
É bolsa isto e bolsa aquilo, minha casa minha vida, programa de aceleração do crescimento e da Copa e agora o tal bolsa móveis e eletrodomésticos. Tudo massificado através de mídias caríssimas, passando a impressão de que estamos com quase todas as demandas atendidas, vivendo num paraíso.
A Presidente Dilma Rousseff, surfando numa imaginária onda de popularidade jamais vista na história deste País, parafraseando seu mentor Luiz Inácio Lula da Silva, resolveu, de maneira irresponsável, antecipar o início do processo eleitoral. Até então, cenários maravilhosos, mar de almirante e céu de brigadeiro, até que de repente começam protestos questionando o valor da tarifa e a qualidade dos serviços de transporte coletivo. Tal qual rastilho de pólvora essas manifestações ganharam as ruas das principais cidades do País, até então era esse o pedido. A revogação de aumentos em várias cidades poderia representar o fim do movimento; ledo engano.
Passados alguns dias, a avalanche de reivindicações e insatisfações ganharam as ruas do Brasil inteiro, e a pauta tornou-se imensa, difusa e incontrolável, como as próprias lideranças do movimento, registre-se que desde o início os mobilizadores sociais se autodefiniram como horizontais, do povo para o povo. Os governos, em todos os níveis, independente de partidos, estão mais perdidos do que cusco em procissão. Uns “criando”, espertamente, grupo de interlocutores, ilegítimos, tentando “dourar a pílula” e se apropriar da iniciativa; outros atribuindo, como de costume, a movimentos reacionários de direita e responsabilizando a mídia por informações ditas tendenciosas. É a velha e esclerosada estratégia do escapismo.
Na realidade, ninguém está aguentando mais; a indignação tomou conta da cidadania. A incompetência dos governantes ultrapassou os limites, não dá para continuar do jeito que está. O copo transbordou e as pessoas foram para as ruas para demonstrar que não aceitarão mais esse descaso dos poderes constituídos. Um executivo que não executa e um legislativo que não fiscaliza, numa conivência criminosa. O que se vê, pelo País inteiro é uma corrupção endêmica e desenfreada, uma impunidade nojenta, tudo começando no Planalto e espraiando-se pela Nação afora.
Uma pesquisa realizada pelo IBOPE, após duas semanas de mobilizações, descortina as reais motivações para que esses milhões de brasileiros e brasileiras, de maneira assustadoramente crescente, continuem a ocupar as ruas. É o assunto da mobilidade urbana, da saúde, da insegurança, da educação, contra os gastos com Copa do Mundo, contra a PEC 37, entre outros, já que as queixas tornaram-se municipais. Mas o “nó górdio” dessa mega insatisfação é a política: vejam que a pesquisa apontou que, para 65% dos entrevistados, essa questão é a principal. Óbvio que dentro da política a corrupção é majoritária. Infelizmente nossos representantes perderam a “vergonha na cara”, mas a saída proposta para tamanho desconcerto é o encaminhamento de um ”Pacto pelo Brasil”, possivelmente liderado pela Presidente da República, desde que esta se disponha a ter grandeza e, com humildade busque, dentro da sociedade organizada, os atores para esta missão patriótica.
Alberto Amaral Alfaro
natural de Rio Grande – RS, advogado, empresário, corretor de imóveis, radialista e blogueiro.